APESAR DE SEUS EFEITOS, O ASSÉDIO MORAL ÀS VEZES ATINGE AS VÍTIMAS DE FORMA QUASE IMPERCEPTÍVEL. POR MEDO, MUITOS MÉDICOS RELUTAM EM DENUNCIAR OS AGRESSORES

A dificuldade para caracterizar o assédio é ainda maior em ambientes que funcionam sob pressão, como no caso dos serviços de urgência e emergência. São comuns os relatos de médicos que atuam sob um regime diário de sarcasmo, ofensas sutis ou berros de seus chefes. Muitos se sentem esmagados pela sobrecarga de trabalho e maus tratos, ficando vulneráveis a toda a sorte de problemas psicossomáticos – que vão de erupções cutâneas, gastrites de repetição até a depressão. Mesmo assim, são poucos os que se veem como vítimas de assédio moral. Afinal, quem se importa em ouvir alguns desaforos quando uma vida está em jogo, pode questionar alguém.
O problema é que o assédio moral afeta também a capacidade de trabalhar e, no caso dos médicos, de salvar vidas. Não por acaso, aqueles que conseguem comprovar o problema no ambiente de trabalho têm o direito de deixar o emprego e buscar uma rescisão indireta. Uma espécie de demissão por justa causa às avessas. A conduta do agressor pode ser caracterizada também como crime contra a honra (como a difamação e injúria) ou contra a liberdade individual (em caso de constrangimento ilegal ou ameaça).
Crises de pânico e de ansiedade fizeram parte do diagnóstico de Paulo*, que precisou de suporte psiquiátrico para ser tratado. O quadro foi resultado de um histórico de abusos por parte de seu superior. “Ele fazia insinuações em relação à demissão. Fazia cobranças absurdas e explorava os rofissionais ao não remunerá-los adequadamente”, descreve.
O médico conta, ainda, que o gestor tentava interferir na vida pessoal dos profissionais, opinando em assuntos que não lhe diziam respeito, como forma de manter controle. Mesmo assim, Paulo não fez nenhuma denúncia por medo de perseguição interna. Já a médica Renata* estava em seu intervalo quando o gestor entrou na sala, sem bater na porta, questionando quem estava no plantão. Aos gritos, mandou-a atender um paciente. Ela ficou estática, sem reação. A dificuldade de assimilar o que estava acontecendo também acometeu Rafaela* quando seu gestor a chamou em particular, tirou dinheiro do bolso e perguntou quanto a médica queria para fazer o atendimento. “Ele disse: eu pago pra você voltar ao trabalho. Não aceitei o dinheiro e atendi a pessoa, mas estava no meu direito. Havia uma paralisação da categoria e não era um caso urgente”, ressalta.Não podemos tolerar que esse tipo de abuso passe batido ou seja tratado como exagero. PAULO DE ARGOLLO MENDES, PRESIDENTE DO SIMERS
Para o presidente do Simers, Paulo de Argollo Mendes, esses casos são mais comuns do que se imagina e muitas vezes deixam a vítima sem saber como reagir - seja pelo choque do acontecimento ou por medo de represálias. Não por acaso, ainda é pouco comum que ocorra a denúncia.
Entre a categoria médica, o receio parece ser ainda maior: inúmeros relatos chegam até o Simers, mas a reportagem não encontrou nenhuma ação ajuizada por assédio moral a médicos junto ao Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT4). "Não podemos tolerar que esse tipo de abuso passe batido ou seja tratado como exagero", conclui Argollo.
Se você suspeita que está sendo vítima de assédio, mas não sabe como proceder, o primeiro passo é buscar a ajuda do Simers. “Vamos orientá-lo sobre as medidas possíveis de serem adotadas, que podem variar de um caso para o outro”, pontua a gerente da Assessoria Jurídica do Simers, Ana Schneider. Ela ressalta que, caracterizada a conduta, é possível postular na Justiça a indenização pelos danos sofridos. A entidade médica está pronta para atender qualquer situação através do telefone (51) 3027-3737.
Para isso, é importante ter detalhes das situações vivenciadas, anotando os episódios com datas, horários e testemunhas que tenham presenciado a prática. Destacar quem foi o agressor e qualificar suas atitudes também é fundamental – caso seja necessário mover uma ação. “Tudo o que for relevante para a caracterização da conduta abusiva, como gravações, vídeos, capturas de tela em rede social e e-mails, deve ser guardado”, aconselha Ana.
Além disso, é possível contar com o suporte do Simers para realizar a denúncia também no Ministério Público do Trabalho (MPT) e na Superintendência Regional do Trabalho. Não deixe de verificar, ainda, canais existentes na própria empresa em que trabalha, normalmente vinculados à área de recursos humanos.
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