O medo de ser médico no Rio Grande do Sul
A Medicina

O medo de ser médico no Rio Grande do Sul

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27/04/2016 09:46

Corredor-hospital-vazio-Pixabay O medo é cada vez mais realidade na rotina do médico e também de outros profissionais de saúde, de pacientes e da população em geral. “Eu tenho medo. Medo de andar na rua, de ir trabalhar e ser o alvo de um criminoso qualquer ou mesmo de uma pessoa de bem que se vê numa situação limite e acabe descontando em mim. Medo de não ter o suficiente para prestar o atendimento básico para o filho de um traficante e ser culpado por isso. Tenho medo de que esse sentimento me faça abandonar décadas de dedicação em um posto da periferia”. O desabafo de um médico gaúcho (que não quis se identificar) certamente encontra eco entre os colegas que dividem mais que uma profissão, mas anseios e temor pelo simples fato de ser médico nos dias atuais. A insegurança e a violência estão em todos os lugares, mas não são os únicos fatores a figurar entre as principais dificuldades da categoria médica em exercer sua função. A precariedade que atinge as estruturas da saúde pública prejudica o trabalho médico e o cidadão que depende do atendimento nestes locais, sem contar a desvalorização e atraso nos pagamentos - cada vez mais incidentes. Apenas nas últimas semanas, o Sindicato Médico do RS (SIMERS) registrou diferentes casos de insegurança, violência, excesso de demanda e infraestrutura insuficiente. Estes exemplos são uma breve amostra de um cenário inaceitável e que requer atitude imediata dos gestores. O SIMERS tem atuado exaustivamente, propondo e buscando junto as esferas municipal, estadual e federal, bem como aos administradores de instituições de saúde, soluções rápidas e efetivas.  

Violência e insegurança assombram profissionais e pacientes em diferentes pontos do RS

  No Pronto Atendimento Cruzeiro do Sul (PACS), na zona sul de Porto Alegre, medo e tensão são sentimentos constantes entre os que lá circulam. As ocorrências de violência no interior e no entorno da unidade ganham espaço nos veículos de comunicação devido a frequência e gravidade dos fatos. Tiroteios, vingança, ônibus queimados e até suspeita de estupro foram registrados no local nos últimos meses, mas a insegurança é histórica. Também na região do PACS, na UBS Vila Cruzeiro, um médico foi alvo de criminoso que o assaltou dentro de um consultório enquanto ele atendia uma paciente grávida. O fato ocorreu no início deste ano e chocou a categoria e comunidade. O ladrão fugiu a pé levando carteira e celular do médico. Localizado em outra região de conflito constante da capital gaúcha, o Centro de Saúde Bom Jesus ficou fechado em março deste ano pois um homem transtornado e armado quebrou vidros da unidade e teve que ser contido pela Brigada Militar e a Guarda Municipal. O Hospital Cristo Redentor registrou há poucas semanas mais uma morte de paciente internado. Foi o segundo em menos de dois anos e sempre com extrema violência, com execução a tiros. O SIMERS quer a instalação de detectores de metais e maior segurança no acesso às áreas internas do hospital. Outra referência em trauma em Porto Alegre, o Hospital de Pronto Socorro (HPS) teve o caso mais recente de tentativa de assassinato de paciente internado. Um homem armado efetuou disparos dentro da emergência. De acordo com a Brigada Militar, o objetivo do criminoso era executar um paciente que recebia atendimento no local. O homem teria entrado no hospital se passando como paciente, dando um nome falso, e conseguiu acessar o setor de emergência após passar pela triagem. Segundo testemunhas, pelo menos seis tiros foram disparados. O atirador conseguiu fugir. Em Santo Ângelo, profissionais sofreram agressões no final de 2015 devido ao longo tempo de espera.  Isto ocorreu no Hospital de Caridade, que contava com apenas um médico para atender emergência, urgência e pacientes internados oriundos de 23 municípios da região noroeste. A demanda diária que passa pela instituição é de mais de 200 pacientes. Após muita pressão, o SIMERS garantiu, em março, a contratação de três médicos para a equipe de sobreaviso e escalas de plantão. Em Rio Grande, bandidos atacaram postos em pleno horário de funcionamento em janeiro deste ano. O alvo foram as armas dos vigilantes dos postos de saúde do município. Em apenas uma semana foram dois ataques que visavam os equipamentos dos seguranças. Ações do SIMERS - O Sindicato defende a adoção de policiamento ostensivo nos locais onde a violência é deflagrada, porém, não de guardas terceirizados, e sim, de integrantes de Guarda Municipal ou da Brigada Militar. “Comparo o que está acontecendo aqui com a situação do Rio de Janeiro, onde quem sai de casa não sabe se volta. O governador Sartori não tem controle da situação no Estado e os marginais não têm mais respeito”, afirmou o presidente da entidade, Paulo de Argollo Mendes. O SIMERS integra um grupo de trabalho com a Brigada Militar e a Secretaria Estadual da Segurança Pública que busca soluções para combater a insegurança nas unidades de saúde. Entre as ações apontadas, está a necessidade de instalação de câmeras de vigilância nesses locais, para inibir a violência.  

Precariedade que dificulta acesso e até impede atendimento

  A precariedade da estrutura de unidades de saúde no Estado e falta de materiais essenciais para o atendimento médico prejudica especialmente o cidadão. Presenciar situações precárias relacionadas à saúde dos gaúchos já é comum para a equipe do SIMERS, e na luta para mudar este quadro, representantes da entidade percorrem o Rio Grande do Sul para vistoriar as casas de saúde. Em Cidreira, o SIMERS constatou que o Pronto Atendimento Central possui apenas um médico plantonista 24h, quando o necessário seria ter no mínimo quatro profissionais. A estrutura física também é precária, há fios soltos na área de atendimento, colocando em risco médicos e pacientes. Dentro dos consultórios tem goteiras, causando transtorno toda vez que chove. Há falta de medicamentos e no alojamento médico é possível enxergar pelos buracos da janela, o que tira a privacidade dos profissionais. Não bastasse toda esta situação, quem procura pelo posto chega a esperar durante cinco horas por atendimento. O SIMERS vai exigir do município a contratação de mais médicos e os ajustes necessários no local para que os profissionais e a comunidade do Litoral Norte sejam atendidos com dignidade. O SIMERS já questionou também o número insuficiente de ambulâncias do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) em Porto Alegre. São 15 ambulâncias no município, mas apenas três estão totalmente equipadas com médicos. “O quadro é ainda mais agravado pela falta de leitos nos hospitais. Além disso, existe a dificuldade de entrar em bairros dominados pelo tráfico, uma situação conflagrada”, afirmou o diretor Jorge Eltz. Na UBS Tronco, na Grande Cruzeiro, zona sul de Porto Alegre, a falta de estrutura, de remédios e até chuva assolam a população. Em uma vistoria, o SIMERS identificou instalação elétrica defasada e com fios expostos, situação que fica ainda mais perigosa diante dos alagamentos que o posto sofre em dias de chuva. Um vídeo feito pelos médicos do local comprova que chove dentro das salas de atendimento.  Em agosto passado, o Sindicato Médico encontrou a UBS Igara, em Canoas, fechada. No dia anterior, o poste de luz que abastece o posto caiu, deixando o local sem condições de atender. Não foi difícil constatar que a instalação elétrica da unidade carecia de manutenção. Assim, como toda a infraestrutura. O SIMERS denunciou, em apedido publicado na mídia local em janeiro, a calamidade na Santa Casa do Rio Grande. Os médicos mantiveram a assistência mesmo com a falta de materiais básicos, como gaze, soro e até mesmo luvas cirúrgicas e também atrasos constantes na remuneração dos profissionais.    
Tags: Medicina insegurança Precariedade na saúde

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